Entenda como a farmácia pode ser essencial na saúde primária no Brasil. Inovação e cooperação fazem a diferença
O sistema de saúde brasileiro enfrenta muitos desafios e um dos motivos é o incremento da expectativa de vida e o consequente envelhecimento da população. Mais do que lidar com a possível perda de qualidade de vida em função do aumento de doenças crônicas, de casos câncer e de problemas de saúde mental, a mudança no padrão demográfico requer mudanças nos cuidados, na gestão e no financiamento da saúde. A matemática é simples: se há menos trabalhadores contribuindo e mais pessoas utilizando os serviços público e privado, cria-se um déficit preocupante.
Ainda que tenha um modelo bem desenhado e reconhecido internacionalmente, o SUS enfrenta obstáculos para evoluir e atender, com qualidade, à totalidade da população que se transforma no Brasil. O desafio também está presente no setor privado, uma vez que os planos de saúde enfrentam um aumento significativo da sinistralidade. Esse cenário abre uma oportunidade para o investimento em atenção primária em saúde, levando-se em conta questões de menor complexidade envolvendo o autocuidado e o que mais é necessário para um bom gerenciamento da própria saúde. Tal contexto tem total aderência com o papel das farmácias e os impactos que podem ser gerados pela inovação e por redes de cooperação entre os agentes da saúde.
Do ponto de vista prático, a farmácia tem vocação para identificar e realizar cuidados primários, contribuindo para a resolução de questões que podem corresponder a quase 80% dos casos que não precisariam de atendimento emergencial. Com grande capilaridade, há uma oferta importante de farmácias e profissionais que nela atuam, em especial, de farmacêuticos. Basta dar uma volta pelas cidades e notamos que há muitas opções a poucas quadras de distância das áreas residenciais. Como acontecia no passado, principalmente nas pequenas cidades, é altamente viável e promissor retomar o protagonismo dos farmacêuticos, de modo que a população tenha neles um ponto focal de orientação e suporte técnico nas frentes de saúde e bem-estar.
Para se ter uma ideia, vale dizer que uma única unidade física de farmácia pode atender entre 6 e 8 mil pessoas do seu entorno. Isso, somada à capilaridade das farmácias no território nacional, indica um grande potencial para que desempenhem um papel nuclear na área da saúde quando pensamos em casos de baixa complexidade.
Para se integrar de forma plena no ecossistema de atendimento à saúde, o setor deve direcionar seus esforços ao paciente e à cooperação com os demais segmentos do mercado. E, com isso, num primeiro momento, recuperar o conceito do “seu” farmacêutico (assim como existe o seu psicólogo, o seu médico, o seu dentista), agente capaz de guiar as pessoas com segurança durante a resolução das queixas simples de atenção em saúde. Em seguida, conhecer individualmente o grupo de pessoas que frequenta com regularidade a mesma loja física, para lidar com suas questões de saúde ao longo do tempo, e, no momento certo, direcionar o atendimento e fornecer informações para os elos seguintes do ecossistema de saúde.
Independentemente do momento de vida do cliente, acreditamos que a farmácia deve estar preparada para coordenar, com eficiência, as ações necessárias para que o cidadão tenha o melhor atendimento possível. Se não in loco, ou seja, nas dependências da farmácia, com o devido encaminhamento para casos de queixas agudas, por exemplo. Do tratamento de doenças crônicas à promoção cotidiana da qualidade de vida, a farmácia deve ser considerada nos diversos tipos de jornada.
Há bons exemplos no segmento de farmácias de pilotos, aquisições, para impulsionar e acelerar a inovação e facilitar as conexões com investidores e startups. O momento atual é de muita execução para se criar uma base sólida e alcançar novos patamares.
Tudo isso, é claro, precisa ser conduzido seguindo algumas premissas. Em primeiro lugar, é necessário construir soluções que realmente sejam centradas e gerem valor para as pessoas. Além disso, lidar com a saúde física e mental dos cidadãos exige uma execução de excelência, sem espaço para o improviso. O espírito de cooperação deve estar acima da competição entre os agentes, independentemente do nível e do papel que ocupam no sistema de saúde.
A farmácia do futuro é aquela que irá cumprir plenamente a sua vocação de estar próxima e conhecer 100% das necessidades das pessoas, coexistindo junto aos demais agentes do complexo ecossistema de saúde. Mais do que um espaço para o consumo de itens necessários para a saúde e o autocuidado, trata-se de uma importante unidade para a cooperação com os mais variados parceiros interessados em promover a inovação em nome do resgate de um nobre propósito: estar ao lado e cuidar das pessoas.
Por: Dr. João Ribeiro, Médico Consultor da RD Saúde, corporação membro do Cubo Itaú