Redes como Covabra, gerida por Dioner dos Santos (na foto), Savegnago e Oscar Calçados criaram verdadeiros impérios no interior paulista e não planejam lojas na capital por diferentes motivos
Com características únicas, o interior de São Paulo representa a maior força do mercado consumidor brasileiro. Seu alto índice de renda per capita faz com que muitas cidades entrem na mira de grandes empresas para expandir suas marcas criadas na capital.
Já para as nascidas no interior paulista, o caminho inverso nem sempre parece tão reluzente. Favorecidas por um público regional, muitas varejistas surgiram, cresceram, desenvolveram modelos competitivos e se tornaram grandes sem nem mesmo chegarem às capitais. E algumas delas, nem pretendem.
Um raio de 200 quilômetros a partir de Sumaré, na região de Campinas, é a aposta do Covabra para o plano de expansão da rede de supermercados criada em 1989. Presente em onze cidades e com 19 lojas, a primeira loja foi aberta em Limeira, com a ideia de atender um público mais selecionado e tendo a inovação como premissa.
Dioner Carlos dos Santos, diretor-presidente da rede Covabra Supermercados, conta que a loja inaugural foi a primeira a contar com leitores ópticos em todos os caixas, em uma época em que isso ainda era pouco comum.
Hoje, o executivo se orgulha de todos os itens do hortufruti ter o RAMA, programa de rastreabilidade que garante a qualidade das frutas, verduras e legumes em que o cliente consegue acessar através do QRCode na gôndola a origem de cada produto.
À frente do Grupo que se mantém familiar, Dioner acompanha pessoalmente o dia a dia da operação e tem outros três irmãos no conselho do negócios - todos convictos de um mesmo propósito: crescer somente no interior.
Atualmente, com cidades como Paulínia, Campinas e Indaiatuba no radar para as próximas inaugurações, Dioner recorda que a partir de 1996, a rede passou a avançar em seu plano de expansão a partir de boas oportunidades de aquisição - que até então, aconteceram nessa mesma região.
Sobre possíveis aberturas na capital paulista, o executivo ainda se mostra reticente por algumas razões. O tamanho da cidade, o crescimento dos atacarejos, a burocracia que negócios em uma grande capital exige, o perfil de loja, o número de funcionários, a concorrência são algumas delas.
"Não faz sentido chegar em São Paulo com uma loja ou duas em bairros específicos. A marca precisa ser forte no interior e ainda há muito espaço para o mercado premium", diz.
Segundo Dioner, desde 1992, o Covabra começou a direcionar o modelo de negócios para a alta renda e sempre buscou inspiração na capital. De olho em lojas menores e seus serviços, sortimento, e para entender como essas lojas menores conseguem personalizar mais e atender o cliente de forma mais cuidadosa.
Outro ponto citado pelo executivo é o posicionamento do Covabra que, no interior, está direcionado a um público premium. Diferente do que ocorre na capital, Dioner argumenta que no interior é possível manter lojas grandes com um padrão de atendimento de lojas menores, como o St Marche e o Grupo Zaffari.
Isso porque, em São Paulo, o volume de clientes seria muito mais concentrado em horários de pico, o que tornaria mais complexo manter o mesmo padrão na capital.
Na visão do executivo, oferecer uma jornada diferenciada ao cliente, desde o estacionamento até o pagamento, com uma loja limpa, bonita, com boa exposição, pão assado na hora, atendimento personalizado e curadoria de produtos, demandaria, por exemplo, uma quantidade maior de funcionários, entre outros custos extras.
"Em relação ao comportamento de consumo não imagino que haja tanta diferença (entre capital e interior), mas sem dúvidas, os clientes da capital teriam muito menos paciência e isso dita muito na operação", diz.
Focado em fidelização, Dioner também é seguro ao dizer que a rede conseguiu estabelecer recorrência com o consumidor do interior. De acordo com o diretor, 95% de faturamento da rede passa pelo programa de fidelização "Bem-Estar" - atualmente com quase 600 mil clientes cadastrados.
MAIS REDES
A mesma ideia é compartilhada por outras duas grandes varejistas que também atuam exclusivamente no interior - a calçadista Oscar, com mais de 200 pontos de venda, e a rede de supermercados Savegnago, dona de mais de 60 lojas.
A rede Savegnago teve a sua primeira loja inaugurada em 1976, em Sertãozinho, a 400 quilômetros de São Paulo. Com o slogan "a rede forte do interior", a família administra hoje mais de 60 lojas em dois modelos de negócio - os supermercados Savegnago e o Paulistão Atacadista (bandeira recém-adquirida pelo Grupo).
Sebastião Edson Savegnago, conhecido como Chalim, que hoje administra o grupo em sociedade com o irmão Antônio Savegnago, responsável pela parte comercial, além dos filhos e sobrinhos, é o rosto da segunda geração, e apesar de não descartar uma loja na capital no longo prazo, diz preferir manter a relevância no interior.
A família Savegnago está há 46 anos explorando o interior - começando por Sertãozinho e pela região de Ribeirão Preto. Agora, o negócio está focado na região de Campinas, onde aconteceram as mais recentes inaugurações.
A empresa comprou no final do ano passado 14 das 28 unidades da rede de supermercados Paulistão, em uma negociação com o Grupo Peralta, até então proprietário da marca.
Com a compra, iniciaram uma nova fase, com algumas unidades já transformadas em Savegnago e outras como parte do plano de entrada no segmento de atacarejos, o grupo investiu R$ 75 milhões e, até 2025, deve ter 15 unidades de atacarejo em funcionamento.
Para que a operação funcione, muita coisa precisará mudar, como a diminuição do mix de produtos, de 15 mil itens para 7 mil, redução dos serviços oferecidos em loja e a própria estrutura mais simples. Tudo para que a operação do mercado fique mais barata e essa diferença possa ser sentida pelo consumidor na hora da compra.
Considerada a maior rede do interior do Estado e a 15a maior do Brasil, de acordo com o ranking da Associação Brasileira de Supermercados (Abras), a marca está em 20 cidades, e serão mais cinco inaugurações até o fim do primeiro semestre de 2024. O grupo reúne 12 mil funcionários e espera um faturamento de R$ 16 bilhões para 2023.
Sem se intimidar com os grandes players, Chalim diz que o Grupo se fortalece ao brigar por preços mais competitivos e ao apostar em serviços que garantem mais de 30% de market share nas cidades em que estão presentes - algo quase impossível de alcançar numa capital, como São Paulo.
IMPÉRIO
Outro império levantado longe da capital é a Oscar Calçados. Com mais de 200 lojas, a rede já tem a experiência de atuar em grandes capitais, como Porto Alegre e Florianópolis. E nesse caso, a história da rede, que começou em São José dos Campos, é outra.
Segundo Bruno Constantino, CEO do Grupo Oscar, a ausência da marca em São Paulo ainda é uma questão de oportunidade. Em 2021, quando o negócio já somava 110 lojas próprias, a Oscar adquiriu a Carioca Calçados, marca catarinense que os levou a operar nas duas capitais citadas.
Nesse meio tempo, Bruno e seu irmão Renan conduziram um novo movimento no grupo ao implementar a mentalidade de startup, além de se reinventar digitalmente na pandemia e criar uma estratégia multicanal, com a retirada das compras do e-commerce nas lojas físicas, facilitar o crediário e permitir que os vendedores pudessem acessar e vender o estoque on-line em poucos cliques.
Em 2022, o grupo foi além ao criar um venture capital, o Oscar Corporate, que investe em startups nas áreas de varejo, fintechs e logística, que ajudem a agregar inovação ao grupo.
"Percebemos que as capitais trazem maior volume e gastos maiores. Os clientes querem marcas mais conhecidas, a parte esportiva é mais forte, mas seriam ajustes pontuais com uma operação bem parecida (ao interior) e que pode ser iniciada prontamente se houver uma boa oportunidade", diz.
Por: Mariana Missiaggia