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Um caminho coletivo para reescrevermos as cidades

Nexo Jornal

Precisamos de uma cidade viva, que se ofereça à criatividade daqueles que nela vivem e faça da vida cotidiana uma experiência compartilhada


As cidades são lugares de encontro. Ou deveriam ser. No Brasil, vivemos um paradoxo: ruas abarrotadas de carros, calçadas estreitas, abandonadas ou interrompidas, muros altos e indiferentes ao entorno, praças que mais afastam do que acolhem, nossos rios sufocados. E, ainda assim, resistimos. Um povo que transforma avenidas em espaços de convivência, que estica a cadeira em frente de casa para ver a vida passar, que percorre trajetos improvisados entre becos e galerias, que encontra, no meio do caos, razões para ficar.


Caminhar em uma cidade é um ato político. É resistir à lógica do asfalto e dos veículos que tomaram espaços onde antes havia a troca, a possibilidade do acaso. Tornei-me urbanista andando pelo centro de Belo Horizonte, minha cidade natal, atravessando as galerias intraquadras, como a do Ouvidor, um trajeto vivo: pequenos comércios que resistem ao tempo, o cheiro de comida que escapa das esquinas, o som que ecoa dos vendedores ambulantes. A Praça Sete, um manifesto vivo, ponto de convergência onde os caminhos se cruzam e as vidas se encontram em feiras, protestos, celebrações, lugar que acolhe os usos e reinventa significados.

Esses espaços do Brasil têm alma, pois abrigam histórias e um cotidiano que vibra. Neles, as cidades se revelam em fragmentos que só quem anda consegue juntar e entender. Caminhar não é apenas se deslocar, é reescrever a cidade com os próprios passos, é criar significados para o mundo que se habita. Jaime Lerner nos ensinou que a “acupuntura urbana” pode revitalizar as cidades, um gesto sensível que se multiplica organicamente, e talvez o gesto mais transformador hoje seja devolver às pessoas a cidade caminhável. Precisamos de praças que abracem, edifícios que conectem, percursos que unam pessoas e paisagens. Precisamos de uma cidade viva, que se ofereça à criatividade daqueles que nela vivem e faça da vida cotidiana uma experiência compartilhada.


Me vem a lembrança a experiência do Espaço Popular de Contagem, que mostrou, talvez pela primeira vez, aos moradores dali que a cidade era deles. Seul, na Coreia do Sul, eliminou avenidas e desenterrou o canal para devolvê-lo aos cidadãos. A espanhola Sevilla recuperou as margens do rio, revitalizando o comércio, criando lugar de caminhada e contemplação. Curitiba permitiu que o rio respirasse, e que as pessoas respirassem o rio. Na Pampulha, em Belo Horizonte, ícone do nosso urbanismo moderno, transformamos uma área assoreada da lagoa em um parque urbano cujo maior ativo é o espaço e a natureza, e que hoje recebe milhares de pessoas diariamente com baixíssimos índices de vandalismo e geração de lixo. Essa é a direção. A cidade pulsa onde o espaço acolhe e o olhar respira.


Para os prefeitos e gestores públicos que começam um novo ciclo, o desafio é claro: é preciso cuidar das pessoas. Promover a qualidade de vida através de espaços de encontro que trazem pertencimento e saúde. Investir em calçadas generosas, parques acessíveis, praças que convidam. Atuar com um olhar sensível e multidisciplinar para os diferentes anseios e necessidades que a cidade abriga. Mais do que infraestrutura, os espaços compartilhados são concretizações de quem queremos ser. Espaços que acolhem esse sentimento e permitem o exercício individual e coletivo de estar no mundo.


Quando abrimos uma rua para as pessoas, estamos dizendo: “Este lugar é seu”. Quando plantamos árvores, damos sombra e acolhemos o futuro. Cidades caminháveis são lugares que celebram a experiência humana. Celebramos o tempo que passamos observando o trajeto, encontrando as pessoas, descobrindo e redescobrindo nosso lugar. Criar esses espaços é um gesto de coragem com o presente e de generosidade com o amanhã. Uma celebração do encontro que acontece enquanto percorremos, juntos, o caminho da vida em sociedade.


Por: Gustavo Penna

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